17.11.11

O Executor e a Reflexiva


Admirável mundo novo,
aquele primeiro que bateu a clava,
com o tronco tocou o fogo
e com a erva temperou a carne.

E aquela que via aplaudia,
e de tanto aplaudir percebeu o Ritmo.
Ouvindo o pássaro assoviar se emocionou,
e decidiu imitar tudo o que era vivo.

Reinventaram juntos a si mesmos,
criaram mitos, arte, história, ciência e conflitos,
do transparente ao opaco o jogo de espelhos.
Da clava à clave de Sol.

16.11.11

Leão


Gosto de carne quente, massa densa,
Sangue e vinho bebe como vampiro.
Quando se atracam, não se sabe se brincam ou se matam.
Com a caça e sua cria, rei da vida, deus da morte.

15.11.11

Peixes


Na água doce ou salgada nada,
no fundo ou no raso.
Louco ou sensato? Fada ou adaga?
Momento e acaso.

Escorpião


Espírito de leão,
em um corpo de formiga.
A terra tão grande,
um imenso mundo cão.

Veneno tão amargo,
de um beijo tão doce,
na cauda um rabo de arraia,
no olhar a flor e a foice.

14.11.11

Ânsia


Ignora a roda criativa há tempos criada,
presumindo ser quadrado
o giro elíptico da geodésica,
dançante à bola de fogo.

O leão na jaula urrava,
O louco no quarto descabelado,
O pássaro cantando da gaiola,
O herói confinado na solitária.

Nuvem-dragão


Você! que quer inundar o mundo
com sua poesia, chuva benfazeja,
não é mais que a águardente, garrafa náufraga
jogada ao mar, colo de Iemanjá.

Californication


Entre o Universo da Arte
e o Mundo da Carne:
que difereça abissal
entre comer e amar!

Muito mais do que amizade colorida
um relacionamento efetivo:
és algo muy raro,
lucro imensurável!

12.11.11

Idéia, ideal


Produtos e processos, fracassos e sucessos.
Rizomas, contâiners, cápsulas e patentes.
Navios, trens, sinapses e parentes.

Atravessando mares, criando pontes,
Cruzando o mundo, em vertigem potente.

O conjurador da chuva


Sabia tão pouco.
O sabiá cantando solto.
O louco gritando rouco.

A secura da garganta.
A fineza do bico.
A chuva que encanta.

para José Servo Primeiro

Frescor, sem frescura


Ele e Ela se encontram,
depois de tanto tempo,
mesmo que apenas alguns segundos.

Tiram a roupa, as máscaras, jogam longe.
Se entregam ao calor, suor dos corpos,
ao Encontro, brandura dos espíritos.

O livro das aparências


Uma multidão de espectros,
dançando juntos,
tal qual "fantasmas nas conchas",
ou tartarugas arrastadas pela rede.

Susurram ruídos,
às vezes gritos,
às vezes música,
notas de rodapé
no "Livro dos dias".

Emoção: idade da razão

"Não é preciso razão para cantar um samba",
para amar a Mulher,
para ouvir o canto do sabiá,
desfrutar a fruta,
olhar o céu, o mar.

Mas é preciso razão para melhorar a colheita,
para selecionar as ervas,
para auferir a têmpera.

E eis que a fé suprema é a razão suprema,
a emoção sábia de uma vida plena.
 

11.11.11

Diário aberto: formulação em prosa de uma inquietação poética, ensaio-manifesto (em processo)


     Certa vez, em novembro de 2009, enquanto pintava a saudosa tela “Eros e Tânatos”, fui abordado por um arquiteto, todo solto, quase caindo em cima de mim, figuraça! Ele me disse: “Qual a profissão de Deus? Arquiteto. E a do Diabo? Advogado”. Realmente, Sempre que analiso a real-unidade, dos amantes, da gestação, da flor de lótus, caio na dualidade: ação e reação, causa e efeito, ou efeito-borboleta, Apolo-Dionísio, Atenas e Vênus, paz e guerra, Masculino-Feminino, Vida e Morte, Razão e Emoção, Yin e Yang, ação e passividade, latente e manifesto, real e virtual, Pai e Mãe, em todos os níveis, da superfície de ventos, topografias e ondas – marítimas, sonoras, sanguíneas, à profundidade serena e abismal do silêncio, particular partícula. Uma imensa diversidade incalculável de pequenos gigantes. E daí às tríades: Sol-Terra-Lua, primeiro-segundo-terceiro, etecetera etcetera etcetera. Uma metafísica adorada desde antes de Pitágoras. Todo o pragmatismo que entendemos do universo, paradigma – elementos de um conjunto, e sintagma – combinações possíveis entre esses elementos. “O jogo das contas de vidro”, como sugeriu Herman Hesse, a apoteose do conhecimento da consciência humana – universal.

     Quero aprender a dançar, sem precisar pensar sobre isso. Ter segurança e calma para, junto a quem precisa, realizar meu ofício. Compreender que na minha fome se esconde o sofrimento de outro ser, aquele que será comido. Entender que o meu medo da morte é a fome de outro, buscando se renovar. E o pavor da dor, que aceito ao me deliciar de carne e sangue, é apenas a falta de disciplina. Como me preocupa o sacrifício de um bicho, parente distante. Mas como é gostoso o bife no prato, esse símbolo do sofrimento. Encontrar uma forma de minimizar essa luta – da mente sôfrega por comida do corpo, o que dela for desnecessário. O suor e a lágrima como pedaços de mar.

     Assim é minha missão, seja na arquitetura, seja na música, seja em qualquer arte – síntese científica: apreender os elementos que a Família (humana) vem desenvolvendo nesse empirismo histórico desde os primórdios, objetos técnicos, técnicas para criar, modelar e usar objetos, e o que fazer com esses objetos, essas técnicas, como usá-las. E são tantas, desde que tomamos consciência da nossa própria organização, biológica, social, psicossomática, nesse imenso formigueiro.

     Na verdade, é difícil conter o deslumbramento com tudo que foi e é feito, natureza e humanamente, desde a beleza da floresta, à aridez do deserto, à queimada do cerrado, À chuva que destruiu Macondo, o tempo passando, "pássaro-tempo", a semente, a folha, a flor e o fruto, da formulação estética musical, passando desenvolvimento técnico-produtivo da história da arquitetura e da civilização pela arquitetura e chegando à sabedoria milenar da medicina e da agricultura celeste. Toda a integração e contraste entre todos esses horizontes em fuga. O saber de que estou apenas engatinhando em tudo que faço, um gatinho mamífero na selva dos leões carnívoros. A contenção e disciplina necessárias para continuar me desenvolvendo sem me equivocar. O panfleto de uma pizzaria aqui do bairro, deixado hoje na caixinha do correio, cita uma interessante passagem bíblica: “PV 19.02 – Não é bom proceder sem refletir, e peca quem é precipitado”. Engraçado, como canta Zeca Baleiro em uma música: “todos somos filhos de Deus, só não falamos a mesma língua”, e não canso de lembrar a orientação do Mestre Daisaku Ikeda, diretriz máxima da contiguidade simultânea, da ação e do contemplar: “observe cuidadosamente, compreenda profundamente, execute num instante”.

     Resta seguir em frente, horizontes em fuga de um futuro sempre imaculado, considerando a mortalidade como a outra face da eternidade, essa dança de Shiva que, segundo os antigos, nunca cessa. Universo em desencanto, horizontes do prazer.

Mel e fel


Amantíssimo.
Amor de muito!
Amaríssimo.
Amor em excesso?

10.11.11

Desobediência civil


O estatuto das coisas avança,
Do fogo-clava ao nano-ser.

A Mãe a todos dá, a todos o Pai ilumina.
O universo se expande. Se contrai?
Velho acordeom, casa antiga.

Na banalidade, a vida simples e bela,
A novidade da música, na performance-sintonia.

Os irmãos nascem e morrem, amam e matam,
Por um punhado de terra, por uma voz amiga.

E a espaço-nave segue firme e forte, sublime,
Indiferente aos processos de uma tabula rasa.

6.11.11

Xis


Horizontal-verticalidades,
um dia a mesa vai virar!
Choro e tango, paz e guerra,
vida e morte, horizontes desta terra!